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terça-feira, 26 de abril de 2011

Despedidas... quem as tem?

 
Não as compreendo, não as aceito… sinceramente, não as suporto!

Na minha vida muitas despedidas ficaram por fazer… não tive oportunidade para as fazer, para que as pessoas as fizessem… A morte da minha mãe foi a despedida não feita que nunca ultrapassei… nunca me despedi dela, mesmo depois de crescer tanto como cresci, mesmo depois de perceber já em adulto, que tinha que lhe dizer adeus. A morte do meu pai que, cheguei na minha adolescência revoltada e pautada pela raiva mal direccionada a desejar, foi outra que ainda hoje não aceito fazer… para mim não morreram… eu é que morri por dentro naqueles dias, embora na altura não tivesse percebido.

Muitas vezes aconselho que se devem despedir muitas vezes, mesmo que para dentro, que devem sentir os segundos dos mais amados como se fossem os últimos, porque um dia não existirá mais hipótese de ter saudade, na presença deles.

Muitas vezes usei a minha história para, parecendo crescido, ajudar as pessoas a valorizar o que têm. 

Mas a verdade, é que não deixei de ser criança. Parei naquele tempo em que a minha vida era comandada por eles. Parei de crescer naqueles dias em que, mal ou bem, de boa vontade ou contrariado, seguia o caminho que eles me indicavam. Ninguém consegue crescer sozinho… e eu não cresci, fiquei eternamente aprisionado num labirinto que é a minha vida, do qual não tenho qualquer referência, qualquer ponto de encontro.

Muitas vezes penso que Deus podia ter-me avisado do fim do meu crescimento… Se Deus o tivesse feito, eu teria sorrido para eles no dia anterior, teria suportado as suas imposições, que hoje sei, eram apenas trilhos, caminhos, indicações…

Se Deus me tivesse avisado, podia ter decidido ir com eles, podia ter escrito uma carta, podia ter copiado frases de um livro, e poderia ter-lhes dito o quanto gostava deles, o quanto precisava deles… se Deus me tivesse avisado, talvez não me sentisse já tão cansado, tão ultrapassado pelo tempo, pelo sentimento de, não uma, mas duas despedidas adiadas, eternamente...

Mas a vida é mesmo um labirinto… hoje tenho a oportunidade de fazer despedidas. Mas continuo a não saber, a não gostar, a não aceitar fazê-las.

Como nos despedimos dos nossos pais? Ainda em vida? Como somos capazes de o fazer?

Há muitas anos atrás, conheci novos pais. Não ficaram imediatamente meus pais… foram ficando com o tempo. Hoje são de facto também meus pais. E a vida trouxe-me até um ponto em que, por ironia, tenho que me despedir deles, em vida, como sempre desejei ter tido oportunidade de fazer com os meus falecidos.
Os meus irmãos... tenho sido negligente com os meus irmãos. Não sei como nem porquê, ficamos afastados... não muito afastados... mas afastados o suficiente para tornar um abraço constrangedor... e é terrivel que tenham passados tantos anos, e eu não tenha percebido isso... como hoje. São meus irmãos... Como posso eu ter vivido assim...
Há muitos anos atrás, conheci novos irmãos além dos meus. Ficaram logo meus irmãos. Especialmente o Luis... era tão novo o Luis quando o conheci. O Francisco ja tinha quinze anos, e aquele ar sorridente que poucas vezes lhe vi sair da cara, já na altura, era um espanto... tão inteligente!
Eles foram os meus irmãos durante muitos anos... talvez por isso, tenha sido negligente com os meus outros irmãos. Mas foram tão bons irmãos... lembro-me da alegria quando me viam chegar... lembro-me dos dedos deles na minha viola, que se depressa se transformaram em notas e músicas... em gostos próprios! Foi tão bom ver-vos crescer...
Lembro-me de tardes inteiras a jogar bilhar, lembro-me de tantas coisas... não me esqueci de nada...

Como me despeço dos meus irmãos?

Penso que nada termina aqui... que nada impede que as relações se prolonguem no tempo... que nada mudará com isto... e a verdade é que o passado não mudará nunca...

Nem sempre estive à altura... nem sempre fui o que esperavam de mim... nem sempre vos tratei da forma que queria, da forma que eu sentia, da forma que cada um de vós merecia...

Existe um primo. O Nuno... é mais que primo. Ao Nuno um dia escrevi-lhe um texto... em folha azul. Foi num dia que senti tanto orgulho, mas tanto orgulho...

Faltas tu... minha Linda! Mas no fundo não me faltas... nunca me faltaste! Fui eu que te faltei... e se palavras tenho para ti... demorarei anos a chorá-las.

Na angústia dos dias em que não estive à tua altura, e foram tantos, tentei arranjar forma de te compensar pelo martírio a que te entregaste... dia a após dia... sabia qual o destino... quis ficar até ouvir-te dizer, o castigo que me deste!

Mãe, Pai, perdoem-me por não estar, perdoem-me por não fazer, perdoem por não conseguir dizer-vos Adeus.

Luis e Francisco, por favor não pensem mal de mim.

Ninguém imagina o que significam estas palavras… ninguém imagina o que é ter que fazer isto. 
Ter que dizer que são meus para sempre, mas que deixarei de os ver, de os abraçar, de os acompanhar… Sinto que sou eu que os mato… que sou eu que os vergo perante uma dor que grande como a minha, cai em cima de mim, e me faz gritar que preferia morrer eu de repente, a ter que fazer isto… que é despedir-me não apenas da minha vida, mas da vida de toda a gente…
 
Por isso, não será feita nunca esta despedida... porque não a compreendo, não a aceito… e sinceramente, não a suporto!

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